sexta-feira, 30 de julho de 2010

Contar histórias vira profissão requisitada

Por Amanda de Santa

A atividade exige, além de técnica, bagagem cultural e imaginação

“Era uma vez uma galinha que nasceu de cara pra trás. Jerusa, como era chamada, andava pra frente como se fosse pra trás, ou pra trás como se fosse pra frente. Era muito engraçado.” Este é um trecho de uma das obras de Sebastião José Narciso - mais conhecido como “Tião Balalão” -, sociólogo e escritor londrinense, que trabalha dando vida a histórias tiradas das páginas de seus livros infantis. Ele, que cresceu ouvindo histórias, hoje leva educação, fantasia e encantamento a crianças e adultos. “Trabalho rindo, brincando. Faço porque gosto, porque é assim que eu sei”. A atividade se tornou profissão em 2001, quando Tião foi convidado a participar de uma oficina de narração de histórias durante o Festival Internacional de Londrina (Filo). O escritor, que perdeu a visão em um acidente automobilístico, se espelhou na própria superação para escrever duas coleções de livros infantis – Engenho da Imaginatião I e II – financiadas pelo Programa Municipal de Incentivo à Cultura (Promic). “Em todos os livros existem personagens que possuem alguma diferença. São histórias cômicas, de superação”, explica. Para o professor de literatura, doutor em Educação e diretor das bibliotecas de Londrina, Rovilson José da Silva, as histórias são alimento para imaginação, fantasia e espírito. Ele diz que o homem é um ser narrativo por natureza. “Sempre existe algo a contar, seja vivido ou imaginado. Faz parte da busca da nossa essência”, afirma. Segundo Silva, a tendência é que a profissão de contar histórias cresça cada vez mais no Brasil, devido às perspectivas de ampliação das bibliotecas e incentivo a leitura. “Hoje a profissão tem sido muito requisitada, porque é uma ferramenta da educação”, confirma Tião Balalão. O que mais o deixa feliz é o reconhecimento. Se engana quem pensa que o único público dos contadores são as crianças. A atividade de narrar histórias se tornou negócio de gente grande e tem atraído e agradado muitos adultos. “Muitas empresas me convidam para contar aos funcionários histórias de motivação”, revela Tião. O diretor das bibliotecas de Londrina, Rovilson da Silva, diz que o contador profissional prende a atenção de seus ouvintes pela oralidade e habilidade de conduzir a palavra. “Técnica, roupa ou objeto algum suplanta o talento do contador”, garante. Ele afirma que Londrina já tem profissionais realizando este trabalho com eficiência e maturidade.

A bibliotecária e professora do departamento de Biblioteconomia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Sueli Bortolin, ministra cursos de narração de histórias, mas diz que mais do que técnica, o profissional precisa de uma boa bagagem cultural e de imaginação. “Narrar é sentir o texto, gostar e vibrar com ele. Passar calor, emoção, permitir flexibilidade e interação com a plateia. Falar com os olhos e com o corpo”, descreve. Serviço: Tião Balalão – 3341-6106 / 9991-3284. www.engenhodaimaginatiao.com.br

Histórias têm o poder de humanizar Histórias são capazes de despertar diversas sensações nos ouvintes. Emoções e sentimentos variam desde alegria, tristeza, susto e alívio. Para a professora pedagoga, Silvia Bortolin Borges, a história amadurece, transforma e faz o espectador entrar em contato com situações da realidade. “Tem histórias que continuam comovendo as pessoas. O tempo não consegue apagar o brilho”. Ela aponta que, recursos como bonecos e teatro de sombra, ajudam enriquecer a narrativa.

Silvia e a irmã, Sueli Bortolin, bibliotecária e professora da UEL, cresceram ouvindo histórias e levaram adiante a tradição familiar. Sueli vê a literatura como uma forma de humanização. Para ela, conviver com personagens de todo o tipo estimula o próprio auto-conhecimento e a preocupação com o outro. “As pessoas não se sentem sozinhas quando comparadas aos personagens”.

Fantasia

A professora, Jaqueline Pucci, é responsável pela “Hora do Conto” - do projeto “Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes” da prefeitura de Londrina – na Escola Municipal Eurides Cunha. Ela afirma que nem crianças nem adultos devem ser privados da fantasia. “Tem histórias que até hoje eu conto e me emociono”, confessa. Jaqueline diz que narra a mesma história para crianças do pré a quarta-série. Após a narração, professora e alunos conversam sobre o tema. “É uma realização muito grande, experiência enriquecedora”.

Mercados de atuação e remuneração

Os valores de remuneração do contador de histórias variam muito de acordo com o tempo de duração da apresentação e também da platéia. A média, segundo o contador Tião Balalão, é de R$ 200 por apresentação de uma hora e meia. Este profissional pode atuar em qualquer espaço coletivo que não tenha sons capazes de intervir na narração: em eventos culturais, escolas, creches, empresas. Tião Balalão diz que pretende atuar também em hospitais, mas de forma filantrópica. “Já cheguei a cumprir um cronograma de 20 narrações por mês.”

Matéria publicada em 07/06/2010

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